6 de fev. de 2010

O Amor e o Transitório

Bem disse Schopenhauer: o amor não é sinônimo de felicidade. E, na era do hedonismo, sofrer por amor pode ser, por incrível que pareça, uma forma muito boa de obter prazer. Conforto, lazer, sensualidade, tudo passa, e o comércio a isso nos impele a seguir adiante, sempre. Já o amor, desejamos, intimamente, que não seja transitório, ainda que o aceitemos assim.
Aviso aos navegantes: o amor há muito não é mais romântico, embora alguma pessoas insistam que seja. Hoje, dar flores sem um “eu te amo” significativo e sincero não ta com nada. A mulher, a exemplo dos conselhos das matronas de antigamente, achar um homem trabalhador e que a sustente, é, no mínimo, ofensivo. Trabalhador e honesto está pra lá de bom. O amor romântico, do “gentleman”, era um amor do sexo frágil. Sabemos, na pós modernidade que frágeis somos todos, em alguns casos. E o poder é delas. Abrir a porta do carro, por exemplo, não é mais importante do que não desligar o celular, atendendo sempre que for chamado. E quanto ao celular, as gentilezas estão dos dois lados.
Dois lados. O amor pós moderno transcendeu vários bloqueios, chamados preconceitos. Ele não tem mais sexo, cor, religião e nem diferenças entre times de futebol. Ele é simplesmente amor, sem regras quanto ao seu objeto.
Desconstruído o amor romântico, o que ficaria em seu lugar? O amor biológico, aquele cujo objetivo central é a preservação da espécie. Duvido. Nunca foi tão fácil amar, e ao mesmo tempo, tão difícil de conceituar. Mesmo que seja inconsciente, como disseram Schopenhauer e a psicanálise, ninguém vai para uma festa procurar pais para filhos saudáveis. Não é esse o grande motivo que leva alguém a querer amar e ser amado. Ah, e não esqueçamos: se for sofrido, como numa novela, melhor é.
A história do casamento não deu ao amor a posição de trono real. Questões, políticas, poder, comércio e conveniências estavam acima do estado motivacional que é a paixão. E mesmo atualmente, com todas as facilidades de encontros, a paixão ainda é mais virtual do que real. Idealiza-se muito, criam-se muitas expectativas que na maioria das vezes, são ilusórias. O amor romântico pertencia ao território do universo livresco dos contos de fada. Não é a toa que conhecemos hoje a “Síndrome de Cinderela”.
O amor é, ao mesmo tempo, a coisa mais social e individual que existe. A proteção, por exemplo, caiu fora da lista. Em seu lugar entrou a soma. Na soma, os fatores são um acúmulo, não uma fusão. Com a soma, respeita-se a individualidade e administram-se melhor os problemas. Veja-se bem: problemas, não diferenças. Mesmo porque não é da matemática somarem-se as diferenças.
Em tempos passados, porém não remotos, o companheirismo era o resultado de uma vida inteira juntos, onde o amor inicial transformava-se numa grande amizade, tornando o viver sufocante se uma das partes morresse primeiro. Hoje, no entanto, o companheirismo é pré-requisito para quem quiser transcender o ficar.
Depois de mil definições, ao amor atual resumiu-se ao que ele realmente possa ser, em essência: afeto e cuidado. Não muito diferente do que seja o amor de um pai por seu filho. Afeiçôo-me e me aproximo; aproximo, proporciono afeto e o recebo de volta. Para que isso se mantenha, cuido. Cuidando, sou cuidado. Reciprocidade, por muito tempo, se possível.
Schopenhauer também disse que o casamento só serve para duas pessoas fazerem de tudo para se odiarem. Teve um amor e um filho com esse amor, mas não casou. Vanguarda de sua época, hoje, normal. Amor não é sinal de matrimônio, obrigatoriamente, mas uma identificação que pode nos fazer olhar para o mesmo lado, sem medo de se encarar.
Um aviso final. Ame, não conceitue. Se entregue, sem medo. Mas não procure a felicidade no amor. Encontre a tranqüilidade em você mesmo, antes. Só um conselho, não auto ajuda. Parerga e Paralipomena, livro de Schopenhauer, não é propriamente um livro de auto-ajuda.

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