7 de mai. de 2010

Mães Mais

Acordo às seis e meia. Sete e cinco o café está na mesa. Café simples, o da classe média brasileira: pão de meio quilo, já cortado em fatias, margarina e geléia. Às vezes, depois de algum aniversário, sobras de bolo. Nas férias, às dez horas, um coquetel de frutas já cortadas ou descascadas. Meio dia e quinze, almoço. A quantidade certa para nós três e depois, para cachorros e gatos. Três horas da tarde, café. Um bom pão de quarto de quilo com maionese, às vezes, rodelas de salame, cortadas finíssimas, na hora. Sete e quinze da noite, janta. Nada congelado, ou sobras do almoço. Um prato novo, quentinho, acompanhado, em geral, por um suco de maracujá, que a voz feminina dominante dizia ser bom para a digestão e para se dormir tranqüilo. No outro dia, tudo de novo, e assim por diante. E, diante de todo esse esforço, no domingo, ou um bom churrasco com a família toda reunida, ou um merecido descanso, com um almoço em um bom restaurante da cidade.
Dedicação. Essa deveria ser a palavra de sinônimo ao termo mãe. Sim, porque toda essa rotina carecia de muita dedicação. Uma mulher e dois homens. Minha mãe, eu e meu pai. Tudo no seu horário britânico. Nosso único trabalho era estar lá. No menu de minha infância, o prato principal sempre foi minha velha, edipianismos à parte. Sim, minha velha, pois minha mãe era minha avó. Taciturna, séria, invocadinha, mas a dedicação encarnada. Não saiu da terceira série do primário. Mas se dependesse de mim, ganharia o título de mestrado em maternidade.
Distância. Uma coisa que não conheci nem na minha infância, muito menos na minha adolescência. Minha avó demonstrava carinho através do cuidado, do chazinho, do horário das refeições. Mostrava afeto quando me colocava pra dormir. Um simples beijo de boa noite. Repreensões nunca foram feitas na frente de outras pessoas, muito menos na frente de estranhos à família. Eram duras, castigos físicos até. Mas tudo de forma velada e sem ira, ou revolta no coração. Quando fui morar com meu pai genético, minha madrasta ainda tinha um quezinho a mais: além do horário britânico nas refeições, aquele conselho sempre bem vindo, fazendo em uma frase aquilo que meu pai não conseguia fazer num texto. Ela quase não falava. Mas esperava a hora certa para dizer o que era mais apropriado para o momento. Tinha uma consciência intuitiva acerca da impermanência das coisas. Coisa que eu só percebo agora, no auge da minha fase adulta. Para essa mãe eu daria o título de mestra em psicologia familiar.
Nenhuma dessas duas mães tem alguma titulação acadêmica. Nenhuma dessas projetou-se na sociedade como apresentadora de tevê, jornalista, esteticista, professora ou modelo fotográfico. São incógnitas para a sociedade. No entanto, para mim, são imortais. Viverão e alimentarão a energia que vem das superstrings que mantém átomos e universo em constante movimento.
Mulheres. Hoje, conquistam sua independência. Estudam, trabalham, crescem profissionalmente, enfrentam o stress do cotidiano. Muitas vezes, graças ao machismo burro que o mundo ainda insiste em manter, têm de chegar em casa e cuidar das crianças ao mesmo tempo em que prepara uma rápida refeição e arruma a bagunça cotidiana. Não passaram o dia juntos, precisam de curtos momentos para a admoestação, carinho, fofocas do dia entre outros. E, nunca dá tempo. O que aumenta a distância. Acho que foi por isso que uma invenção militar como o celular tornou-se um acessório usado por simples mortais. Para diminuir essa defasagem familiar. Não existia celular na minha infância e adolescência e, se existisse minhas mães com certeza repudiariam a ideia. Imagina só um torpedo dizendo: “Vem jantar”, ou um e mail: “Bota o chinelo”. Não, não pegaria mesmo.
Pareço um dinossauro retrógrado com dor na joanete. Mas não posso deixar de expressar e denotar a diferenciação entre o ser mãe ontem e o ser mãe hoje. Nos Estados Unidos é crescente o número de mulheres que adotaram essa profissão, a de ser mãe e parceira. Não são mais condições familiares. São profissões. Em minha opinião, com direito a mestrado. Mas não defendo que a mulher deva fazer isto por imposição da lei da selva, mas que alguém precisa estar menos distante de seus filhotes, isso eu defendo. Afinal, alguém tem que ser mãe nessa casa.
Mãe não é mais uma denominação associada a sexo. Um pai pode ser uma boa mãe. Um pai pode saber fazer bolinhos de chuva como ninguém. Não importa de onde vem a dedicação e o bom conselho. Importa que haja uma boa “mãe” por detrás disso e não uma tevê a cabo, a internet ou um vídeo game. A frase de ordem é: “olha o que eu COMPREI pra vocês, crianças”, enquanto que a frase que eu ouvia era “olha o que eu FIZ pra ti”.
Feliz dia das mães, a todos aqueles que deixam um pouco suas carreiras de lado e se dedicam àqueles que um dia, também serão mães.

PS: Essa crônica é uma homenagem a duas grandes mães que tive na minha vida, e que se imortalizaram: Maria Amália e Emília Correa.

Um comentário:

  1. A Meu Dispor gostei demaisssss... só tenho uma mãe que tem o quilate de 89 anos de vida e que ainda escuta bem. lê corretamente, dentes naturais e não caducou... 23 gestações, sendo eu a 19ª.
    Em certa ocasião de nossas vidas, ela foi uma guerreira, uma mulher destemida, corajosa, determinada!
    E nós que fizemos parte desta ocasião (eu com quase 12 anos de vida), a rodeávamos ouvindo seus planos, instruções e ajudando a preparar tudo.
    É o máximo que tenho dela!
    Agora guardo comigo, sua fraqueza forte de contemplar o sepultamente do primeiro filho. Sim, da caçula, a que mais ela pode dedicar.
    Ela venceu mais esta! MaryMG

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