18 de fev. de 2012

Reforma do Ensino

Uma das grandes reclamações feitas ao ensino atual é que ele é por demais acadêmico, teórico e distante da realidade do aluno na produção de saberes. Ensina-se o que poderia ser considerado básico no fundamental, que recebe esta alcunha, mas que não tem lá muito fundamento. Cobram avaliações ainda no sistema estímulo-resposta, mais como forma de mostrar quantitativamente aos pais dos alunos algum tipo viável de produção. Uma eficiente simulação do binarismo exigentes-exigidos no que tange ao trabalho moderno.
É raro ver, nos dias atuais, crianças dizendo que serão bombeiros, pilotos de avião, astronautas, médicas ou bailarinas. Lembro-me como se fosse hoje: eu tive, na sexta série, um colega de aula que não tinha o antebraço esquerdo e dizia para todos que um dia seria bombeiro, daqueles que apagam incêndios. Alguns riam alto, outros olhavam pro lado, era constrangedor. Não sabia o que dizer ao pobre menino. Nem imaginava o que era preciso fazer para ser bombeiro. Mas uma coisa eu tinha certeza: ele nunca seria aprovado por causa do braço. Um dia, estávamos na biblioteca pesquisando em livros (é, isto existiu um dia), e de repente, numa enciclopédia (não, não a wikipédia – a internet apareceria somente 17 anos mais tarde), apareceu uma foto enorme de um bombeiro subindo numa Magirus a fim de resgatar uma mulher na janela de um edifício em chamas. Caiu a ficha. Não havia como subir aquela escada enorme com um braço apenas. Frustração infantil. Vencida facilmente. Encontrei-o a alguns anos atrás e é um administrador de sucesso. Apaga incêndios. Mas financeiros, organizacionais. E para estes, basta o cérebro.
Por outro lado, não é raro ver meninos da atualidade sonhando em ser jogadores de futebol. Um sonho que não se sonha, pois muitos desses meninos já estão em escolinhas de futebol, esperando o momento e a pessoa certa. Um messianismo. O “olheiro” que vem caçar talentos e descobre o futuro craque, este sendo "salvo" da incógnita e da pobreza. Um deles ascenderá na cadeia alimentar. Os outros terão apenas o benefício do esporte como atividade física. Muitos sonham chegar ao Barca, passando por Flamengo (ou o contrário, dependendo da lambança fizerem no exterior), mas acabarão com um salário médio, em algum time do interior que lutar para chegar à série B do Brasileirão. Superstição? Sim, quase todos os meninos. Acham que imitando cortes de cabelo de certos craques alcançarão a fama desejada. Aí, o menino de dezessete anos deixará a casa de seus pais, pobres, e arranjará contrato num time grande, ou médio e pequeno do exterior. A glória. Uma casa nova. Um carro novo. Namoradas novas que acreditam piamente em amor à primeira vista e que não se importam com dinheiro. E isto sem passar pelo chato ensino acadêmico brasileiro.
Bem, é partindo desse cenário tupiniquim techno funk de alta definição em 4-D que proponho uma reviravolta total e irrestrita no ensino médio nacional. Mudam os interesses, mudam-se os métodos. Física, Química, Matemática, Português, Inglês, Literatura, Filosofia, Sociologia, Artes entre outras coisas supérfluas não são mais produtoras de “real” conhecimento. Afinal, Abaporu não é nenhum jogador recentemente contratado da África do Sul. Estas disciplinas estão totalmente demodês, não servem pra nada. Pense num grupo de jovens num barzinho à noite debatendo sobre a Segunda Lei da Termodinâmica, ou analisando a atual conjuntura política à luz do processo de desconstrução da Ditadura Militar. Ridículo, a não ser que os referidos alunos sejam nerds. O menino ou o adolescente que sonha em ser jogador de futebol necessita de outros saberes, urgente. Não demorará muito, as meninas também estarão neste mesmo patamar.
Vejamos então? O que um jogador precisa saber a fundo, além do trato da bola, para se dar bem no soccer business? Em primeiro lugar, as disciplinas de Estética Automobilística e Estética Capilar seriam um bom começo. Outra matéria indispensável é a administração do erário. Alguém que ganhava até três salários mínimos de ajuda de custo, que passe a ganhar R$ 200.000,00, fora luvas e direitos de imagem, precisa ter uma mente treinada para saber o que fazer. Abrir uma instituição de caridade talvez em uma vila pobre, mesmo que a Prefeitura da cidade precise encampar o projeto mais tarde. Também, outra disciplina de altíssima importância no mundo futebolístico é o de Relacionamento Social, a fim de que o jogador vislumbrado mais com seu dinheiro do que com seu futebol não arranje amizades escusas e acabe servindo de laranja para um traficante. No campo científico, podem-se criar disciplinas tais como Planejamento Familiar e Introdução ao Teste de DNA. Com isto, se o boleiro não for bem na primeira disciplina, com certeza conseguirá se safar na segunda. Algumas Mulheres adoram ter filhos com jogadores famosos. E, como complemento, aulas de Direito Cível, a fim de resolver a pendenga da namorada que apanhou da famosidade esportiva.
Uma renovação na grade curricular: a inserção de disciplinas eletivas, assim como se fazem nas Universidades: o esportista poderá optar entre "Comunicação Retórica Repetitiva Midiática", "Expressão Corporal - Dança de Pagode e Sertanejo Universitário", "Introdução ao Processo de Transição de Jogador Medíocre a Técnico", "Introdução à Técnica Vocal de Garganta para acompanhar Duplas Sertanejas", ou até mesmo a tão concorrida disciplina "Treinando o Pé e a Língua para se eleger Deputado". São muitas as perspectivas no universo complicado de um jogador de futebol. Quanto aos bombeiros, sobram os salários miseráveis e greves com prisões. Não vale a pena salvar. Outros o façam.
Meninos são espertos, meninas também. Não sonham com coisas irreais como ser a primeira bailarina do Teatro Municipal, ou Escritor de grandes romances. Jogadores que mal sabem se expressar ganham prêmios na ABL. Meninos e meninas sonham com o que é concreto, com o que dá um resultado final satisfatório. Ah! Que tempos maravilhosos vivemos...

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