4 de abr. de 2012

A "Prática" do Bem

"Ele me bate e ainda diz Deus te abençoe". Desabafo do garoto sensação do momento num jogo de campeonato regional. Uma frase que pode muito bem, resumir o que é o mundo hoje. No coração e na mente, o princípio do bem, da redenção e da salvação; na hora do "vamos ver" os fins justificam os meios.
O processo da inquisição medieval seria hilário, se no fim não houvesse tortura e morte. A mínima acusação por parte de alguém gerava um processo cujo resultado seria a confissão, após passar pela experiência de uma dama de ferro. Damas. Sim, as mulheres eram o foco principal. Quando queimavam, exalavam um odor mais agradável do que os homens. Eram perseguidas. Vistas como instrumentos do demônio. Não é difícil de entender a raiva da Igreja pelas mulheres: os sacerdotes simplesmente não podiam tê-las.
Milhares se arrependiam sem saber exatamente do que. E o clero perdoava sim. Então, por que eram queimados? Para serem purificados, uai. Com a purificação do fogo, a alma poderia ser aceita nos céus. Apanhavam, sofriam, queimavam. Mas...que Deus as abençoava, não havia dúvida.
A religiosidade popular brasileira ainda é intensa. O que mudaram foram os vetores, na última década. O sincretismo religioso brasileiro está regerando a significação do ser religioso: um pentecostalismo latino com elementos afros. Maravilha. Praticamente um novo conceito em religião. Retetés são uma demonstração disto. Uma música repetitiva com forte ritmo afro-brasileiro, letra da música com teor evangélico e uma noite inteira de louvor.
O futebol, convenientemente, é um rio farto para se pescar homens. O número de jogadores evangélicos é grande. Outras religiões também, no entanto não se vêem manifestações como as dos evangélicos antes de começar uma partida. A oração ostensiva antes e depois das partidas sempre foi um ótimo marketing.
Há uma arqueologia do saber. Mas também há a do sentir, ao meu ver. E a religião ligou-se fortemente ao sentimento do bem estar espiritual. Também em épocas passadas a religião foi referencial de moral, ética e bons costumes. Hoje, em muitos casos, sobra o discurso.
O garoto é rápido, habilidoso com a bola. Domina-a com maestria. Mimado pela mídia. Mas não pelos colegas de trabalho. Quem não pode pará-lo com habilidade, tentará pará-lo na força. Força num esporte de contato transforma-se em violência com muita facilidade. E aí vem o conflito.
Prega-se a paz, o amor. Mas mesmo um volante ou um zagueiro precisa sustentar família e outros gastos. E não deixar passar o garoto hábil é uma forma de garantir o pão na mesa, ainda de forma violenta. Como sempre, os fins justificam os meios.
Talvez o "quem amar sua mãe ou pai, ou filho ou filha mais do que a mim não é digno de mim" se aplique neste caso, ou mesmo, "amai vossos inimigos", mas não sei. Não sou teólogo e a teologia da prosperidade ainda não criou uma cláusula que contenha um inciso em que o mostrar a outra face não se aplique em um jogo de futebol profissional.
Uma frase define o momento. Define o discurso, define a prática. Espero, sinceramente, que os assaltantes não adotem esta prática. Ser assaltado, apanhar e ainda ouvir: que Deus te abençoe. Não pegaria bem. O mal não pode ser confundido com o bem. Ou pode?

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